Imigração italiana: a importância da união entre as entidades
No aniversário de 150 anos da chegada dessa etnia ao Brasil, é preciso somar forças e encontrar soluções que beneficiem toda a comunidade italiana
Neste ano, a comunidade italiana no Brasil comemora os 150 de imigração ao país. A data marca a chegada em Vitória (ES), em 1874, do navio La Sofia, que trazia cerca de 400 imigrantes provenientes das regiões de Trento e Vêneto.
Hoje, o país abriga cerca de 30 milhões de descendentes de italianos, segundo estimativas da Embaixada da Itália no Brasil. Trata-se de uma população três vezes maior do que a de Portugal. Entre os brasileiros que possuem cidadania italiana, o número já ultrapassa 750 mil.
Para quem não sabe, o reconhecimento da cidadania é um direito a todos os descendentes de italianos, mesmo que não tenham nascido no país europeu ou que não possuam sobrenome típico da região. De acordo com o ‘Jus Sanguinis’ (ou “direito de sangue”, na tradução do italiano), previsto na Constituição do país, o reconhecimento ocorre por meio da apresentação de certidões e documentos que comprovam os laços consanguíneos com o ascendente nascido na Itália, independente da geração.
Nos últimos anos, o número de brasileiros que buscam a cidadania italiana tem aumentado. Infelizmente, os consulados e outros órgãos administrativos italianos não conseguem cumprir os prazos estipulados devido à alta demanda. Muitas pessoas recorrem, inclusive, à via judicial, já que na via consular a média para obtenção do reconhecimento de cidadania é de 10 anos.
Com isso, também aumentou a procura pelos serviços de assessoria. As empresas especializadas em reconhecimento de cidadania e outros serviços consulares estão no mercado para ajudar os requerentes a tornar todo o processo mais ágil e eficaz. Por conhecerem profundamente os processos, elas contribuem para que os documentos sejam apresentados corretamente, com traduções adequadas, nos órgãos competentes e usando os meios adequados.
Contudo, essas organizações não são vistas com bons olhos pelos órgãos consulares e outras instituições da administração italiana. Não é exagero citar, inclusive, que existe certo preconceito contra esses prestadores de serviços. Na Câmara de Comércio Ítalo-Brasileira de São Paulo, por exemplo, há uma determinação do Consulado para que essas empresas não se filiem a essa organização. Não raras vezes, elas são responsabilizadas por esse aumento na procura pelo reconhecimento da cidadania italiana.
Os 150 anos de imigração italiana é um momento adequado para falarmos sobre unir forças e encontrarmos soluções que beneficiem a todos. De nada adianta cultivar essa rivalidade entre as prestadoras de serviços e as entidades do setor. É a partir da valorização e da contribuição de todos que será possível avançar.
Além disso, o marco dos 150 anos é uma ocasião mais que especial para a valorização da cultura da Itália. Gostaria de ver a união entre os círculos italianos, escolas de idiomas, consulados e prestadores de serviços, para a promoção de festas tradicionais, cursos e outras ações que ressaltem a importância dos italianos para o Brasil e para o mundo. Não apenas uma parceria institucional, mas em iniciativas efetivas que envolvam toda a comunidade italiana no Brasil.
Nunca é demais lembrar a riquíssima herança que os italianos deixaram ao país. Para além da culinária e da forma como nos expressamos, os italianos contribuíram para a evolução e o crescimento do Brasil. Eles trouxeram uma visão societária e de organização produtiva, além de um forte senso empreendedor. Muitos italianos abriram seus negócios e prosperaram, participando ativamente da economia, da política e da cultura brasileira.
Embora o estado de São Paulo abrigue mais da metade dos descendentes de italianos, as cidades localizadas na região Sul conseguem preservar, de forma mais efetiva, os costumes e tradições do país europeu. Sempre sugiro a região serrana do Rio Grande do Sul para quem deseja conhecer um pouco da Itália sem sair do Brasil. Em algumas cidades, as pessoas falam dialetos italianos e os hábitos são idênticos aos das famílias de lá.
Infelizmente, no momento que vivemos atualmente, de intensa globalização, a história e a cultura italianas são pouco valorizadas. E isso é natural, não está acontecendo apenas com a cultura italiana, mas também com a alemã, a japonesa, a judia e muitas outras. Os adolescentes, em especial, estão deixando de lado questões mais familiares e abrindo-se para o mundo. Mas é importante refletir sobre a relevância da nossa herança cultural para a construção dos nossos valores e da nossa vida.
O aniversário de 150 anos de imigração, como ocasião especial para resgatar a cultura e a história desse povo, é ainda mais relevante aos brasileiros que obtiveram a cidadania italiana. Isso porque ainda é comum encontrarmos brasileiros que buscam o reconhecimento apenas pelas facilidades do passaporte italiano.
De acordo com a Constituição da Itália, um cidadão nascido no Brasil, por exemplo, é tão italiano quanto um nascido no país europeu, estando sujeito aos mesmos direitos e deveres. Alguns italianos se ressentem disso, justamente porque não se reconhecem nos cidadãos que nasceram em outros países. Por esse motivo, não são incomuns as tentativas para mudar a legislação do país sobre reconhecimento de cidadania.
De fato, há alguma similaridade entre os italianos e brasileiros, porém os italianos não são tão expansivos quanto os brasileiros. Eles também são bastante formais perante órgãos públicos, por exemplo, e nas suas relações. Os italianos também valorizam muito as suas vestimentas e a produção própria e artesanal. Lá, os hábitos e costumes são preservados nas famílias e passados de geração para geração.
Por isso, para quem já possui a cidadania italiana, eu recomendo que entendam minimamente sobre o que é ser um italiano. Conheçam a história do país, a cultura e o idioma. Para quem tem condições, visite a Itália e saiba sobre as suas origens. Para quem não tem condições, envolva-se com a comunidade italiana na sua região, participe das festas, dos eventos. Só assim será possível ter uma postura mais respeitosa com a sua ancestralidade e não sofrer preconceitos. É um processo de ressignificação sobre o que é ser italiano fora da Itália. E eu garanto: os descendentes de italianos só têm a ganhar com esse movimento.
Por: Camila Malucelli
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